Como o Bilionário Agro Brasileiro Domina o Global Investor Day da John Deere

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“Estamos prestes a iniciar uma jornada por uma terra abençoada com recursos abundantes, clima favorável e vantagens geográficas únicas. Um país que cresceu e se tornou uma das maiores potências do mundo.” A frase acima não foi dita por nenhum patriota messiânico em praça pública. Ela saiu da boca do norte-americano John May, 55 anos, chairman do conselho e CEO da Deere, ou John Deere, como é chamada uma das maiores fabricantes globais de máquinas agrícolas, florestais e de construção, se referindo ao Brasil. May saiu de Moline, em Illinois (EUA), onde está a sede da companhia, um complexo de quatro grandes edifícios no subúrbio da cidade, para alguns dias no país. Sua missão? Convencer investidores de que sua companhia, que no ano passado faturou US$ 51,7 bilhões (R$ 288,2 bilhões na cotação atual), está no caminho certo: o Brasil, definitivamente, é a bola da vez e é aqui que os investimentos devem pousar.

Na tarde desta terça-feira (10), ele recebeu em Indaiatuba, interior de São Paulo, cerca de 40 super investidores globais, vindos da Europa, Canadá, Japão, Estados Unidos, para o Investor Day da companhia. O último ocorrido no Brasil foi há exatos dez anos. Como CEO desde 2019, May imprimiu na direção da John Deere uma liderança pautada na digitalização e conectividade visando a agricultura de precisão e as máquinas autônomas, intensificou investimentos em eletrificação e comprou startups de inteligência artificial. Mas isso já não basta.

Olhando para o último quarto de século, a centenária John Deere acredita que a saída está no potencial de crescimento do Brasil e direciona cada vez mais seu arsenal para as terras tropicais com um discurso que faria a glória de qualquer ambientalista. “Não se trata apenas de escala. Trata-se também de crescimento sustentável”, disse May. “À medida que a demanda global por alimentos cresce, o Brasil está pronto para atendê-la, com potencial de dobrar sua produção na próxima década, incluindo grãos, carnes, frutas e hortaliças. Por meio da recuperação de 22 milhões de hectares de pastagens degradadas, podemos aumentar a área plantada em 27% nos próximos 10 anos, tudo isso preservando as áreas de conservação.”

A escolha de Indaiatuba para recepcionar investidores endinheirados não foi por acaso. A empresa os recebeu em seu Centro de Pesquisa e Desenvolvimento, um complexo inaugurado no ano passado que custou R$ 180 milhões, de um total de R$ 3,3 bilhões investidos no Brasil, nos últimos anos. Similar a esse centro há apenas duas outras unidades, uma nos EUA e outra na Alemanha. “Nosso objetivo é projetar e desenvolver as soluções movidas por tecnologia e com a maior geração de valor que a indústria já viu. E isso nos traz ao Brasil”, disse May.

Nas mãos dos investidores, a John Deere colocou um compêndio de 50 páginas, no qual a primeira com dados sobre o país começa assim: “O Brasil se tornou uma ‘superpotência agrícola’, oferecendo oportunidades para mais crescimento”. E na sequência, aquilo que apostam. O país é o maior produtor e exportador mundial de soja, responsável por 58% do comércio global, com projeção de crescimento de 46% nos próximos dez anos. Na cana-de-açúcar, o Brasil também lidera na produção e nas exportações, com 52% da fatia global e crescimento de 20% na próxima década. Com o milho, o país ocupa a terceira posição em produção e a segunda em exportações, tomando 24% do comércio global, mas deve chegar a 50% em dez anos. E no algodão, o Brasil se destaca como terceiro maior produtor e líder em exportações, com participação de 30% no mercado global, com previsão de 38% até 2034.

Joshua Jepsen, CFO da John Deere desde 2022, mas na empresa desde 1999, quando começou ainda como estagiário, é um grande conhecedor do Brasil, onde está frequentemente desde 2001. É com um português arrastado, mas muito preciso que ele crava o Brasil no centro da estratégica para o futuro da companhia. “Estamos aqui para celebrar os últimos 25 anos e para mostrar o que estamos construindo para os próximos 25″, afirmou. “O Brasil é um mercado jovem para nós, comparado aos Estados Unidos, onde estamos há 188 anos, mas com uma evolução muito mais rápida.”

Atualmente, o Brasil é o terceiro maior mercado da John Deere no mundo, atrás dos Estados Unidos e da Europa. No entanto, esse ranking deve mudar em breve, segundo Cristiano Correia, vice-presidente de sistemas de produção para a América Latina. “Se considerarmos a Europa como uma série de países e o Brasil como um só, ele já ocupa o segundo lugar. E deve ultrapassar a Europa como região dentro de 5 a 10 anos”, afirma.

Segundo os executivos, isso vai acontecer porque o ritmo de crescimento da produção agrícola no Brasil é o mais acelerado do mundo. “Não existe outra geografia com um CAGR [taxa composta de crescimento anual] tão alto quanto o Brasil nos próximos 10 anos”, afirmou Correia. “Isso se traduz diretamente em aumento de demanda por máquinas e tecnologia.”

De pequenas a gigantes, mais máquinas voadoras no campo

Em uma conversa exclusiva com a Forbes Brasil, eles detalharam a visão da empresa sobre o futuro do agronegócio brasileiro visando a mecanização de alta potência, a democratização tecnológica e as novas formas de financiamento, inclusive com linhas dolarizadas.

O mercado brasileiro de tratores tem apresentado uma tendência clara de crescimento na demanda por máquinas de alta potência. “Nos últimos dez anos, a média de crescimento tem sido de 2 a 3 HPs por ano”, afirma Correia. Segundo ele, a procura por modelos como os 7M, 8R e 9R, que são as linhas de tratores agrícolas de média a altíssima potência, era impensável no Brasil há poucos anos, mas hoje já atrai compradores. São máquinas ultrapotentes de 700 cavalos, capazes de arrastar uma plantadeira de até 60 linhas, ou numa imaginária tarefa, arrastar 40 caminhonetes médias enfileiradas em estrada de chão batido.

Esse movimento pela potência é puxado principalmente pelos grandes produtores do Cerrado brasileiro. A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), e a ASABE (American Society of Agricultural and Biological Engineers) adotam o limite de 150 cavalos como ponto de corte entre média e alta potência, máquinas destinadas a culturas extensivas.

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Cristiano Correia, vice-presidente de sistemas de produção para a América Latina

“O Brasil ainda tem 55% do mercado de tratores abaixo de 100 cavalos, o que é muito relevante. Mas estamos vendo um avanço expressivo no segmento de alta potência, especialmente em regiões de agricultura extensiva”, diz Correia, embora os executivos reforcem com insistência que a marca não está voltada apenas aos gigantes do campo. “Lançamos também soluções para pequenos produtores, inclusive com tratores um pouco mais potentes que atendem à agricultura familiar”, diz Jepsen.

É justamente a diversidade do agro brasileiro que a empresa quer mostrar a esse mundo dos investimentos. “O Brasil é único. No Sul, encontramos propriedades pequenas e culturas de alto valor agregado, com perfil semelhante ao europeu. Já no Cerrado, o cenário lembra o Meio-Oeste dos Estados Unidos, com grandes áreas e alta mecanização”, disse Correia.

Para ele, potência e tecnologia embarcada é o novo mantra. Uma parcela significativa de produtores médios têm demonstrado forte interesse por inovação, mesmo sem adquirir máquinas novas. A solução? Kits de agricultura de precisão. “Já vendemos mais de 4.000 kits no Brasil. Eles permitem que uma máquina de dez anos atrás passe a operar com conectividade, GPS e monitoramento em tempo real”, afirma Correia. Esses pacotes tecnológicos permitem que produtores atualizem equipamentos antigos com sensores e automação, sem precisar adquirir um novo maquinário. “Isso aumenta a penetração da nossa tecnologia e torna a adoção mais acessível.”

Jepsen explica que nos EUA, a média de idade das máquinas que recebem esses kits foram compradas lá em 2012, o que indica uma estratégia clara de retrofit para ampliar o acesso à tecnologia. “Estamos conseguindo levar automação e inteligência a produtores que antes não tinham acesso”, diz ele.Para o Brasil, a empresa ainda não consegue identificar dado similar porque esse é um serviço recente no país.

Crédito em dólar: tendência ou risco?

Sobre o avanço das linhas de financiamento em dólar para compra de máquinas no Brasil, uma tendência que ganhou força em função das altas taxas de juros, segundo Correia, a John Deere acompanha de perto esse movimento, evita fazer previsões e vê com cautela. “Depende do perfil do cliente. Temos clientes grandes com estrutura de capital dolarizada, mas outros preferem manter o financiamento em reais”, diz ele. Jepsen complementa: “O que buscamos é oferecer opções. Por isso, fizemos uma joint venture com o Bradesco para ampliar nosso portfólio de crédito. O produtor deve escolher o que faz sentido para sua realidade financeira.”

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Joshua Jepsen, CFO da John Deere, um perito em Brasil

Correia acredita que o avanço do agro brasileiro está criando um novo estrato de produtores, uma espécie de classe média rural com mais acesso à tecnologia, ao crédito e ao poder de decisão do que melhor se encaixa em seu negócio. “Esses produtores não necessariamente buscam potência máxima, mas estão atentos à eficiência. E é aí que entra a agricultura de precisão”, explica.

Para a John Deere, é essa classe emergente que representa a oportunidade estratégica. “Queremos estar presentes em todas as faixas de produção, oferecendo tecnologia adequada à realidade de cada cliente”, afirma Jepsen.

John Deere e Brasil na mira do mundo

Alguns poucos jornalistas convidados para o “Investor Day 2025 John Deere”, como a Forbes Brasil, foram orientados a não interagir com o grupo de investidores. Mas era claro e foi possível acompanhar dedos frenéticos de investidores fazendo anotações em seus laptops e smartphones. Ao entregar a batuta para que sua equipe de especialistas explicasse o Brasil a eles, John May disse: “espero que vocês cheguem à mesma conclusão que eu. Ninguém está melhor posicionado para gerar valor diferenciado e crescimento sustentável na agricultura brasileira do que a John Deere”.

O humor e a disposição dessa turma pode dar fôlego extra a um mercado global de máquinas agrícolas que passa atualmente por um momento de desaceleração, após anos de crescimento impulsionado por preços elevados das commodities, forte demanda pós-pandemia e estímulos governamentais. A própria John Deere havia faturado US$ 61,2 bilhões em 2023, valor 15,6% maior que o de 2024. Para todo o ano fiscal de 2025, a estimativa da companhia é lucrar de US$ 4,7 bilhões a US$ 5,5 bilhões, na mesma faixa do ano de 2021, quando o lucro foi de US$ 5,9 bilhões. Desde então, vinha ficando sempre acima, com o máximo de US$ 10,2 bilhões em 2023. Mas vale registrar que há 10 anos, o lucro era de US$ 1,9 bilhão, como foi em 2015.

A busca por bons resultados o mais rapidamente possível vale para todos, incluindo outros grandes grupos, entre eles a CNH Industrial, dona de marcas como Case IH e New Holland, e a AGCO, das Massey Ferguson, Fendt e Valtra. Após um ciclo de forte demanda entre 2020 e 2022, o setor tem enfrentado queda nas vendas desde 2023, especialmente nos Estados Unidos e na Europa.

A Association of Equipment Manufacturers (AEM) chegou a reportar queda de dois dígitos em algumas categorias de tratores e colheitadeiras em 2024, nos EUA. Na Europa, a queda foi marcada por incertezas políticas, o que levou a preços agrícolas menores e margens mais apertadas para produtores. Enquanto isso, para as companhias, o recorte da América Latina foi outro, principalmente tomando o Brasil. Sim, o mercado também mostrou sinais de desaceleração, com maior seletividade na compra de máquinas, mas para as companhias é hora de acelerar. “Vocês entenderão por que a John Deere pretende gerar valor consistente para nossos clientes”, sentenciou May aos investidores.

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