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Em 2025, vivemos um paradoxo curioso: de um lado, o ouro alcançando recordes históricos, impulsionado pela busca por segurança em tempos de incerteza; do outro, as ações de tecnologia, especialmente as ligadas à inteligência artificial, em plena euforia, com avaliações nas alturas e alertas de bolha se multiplicando.
Se você acompanha o noticiário econômico, provavelmente também sente essa hesitação: refugiar-se no tangível ou arriscar-se no digital? Mais do que nunca, o velho mantra da diversificação se prova atual. Com estratégia e leitura de cenário, é possível aproveitar as oportunidades em qualquer dos dois mundos.
O pano de fundo: juros, inflação e instabilidade
Os movimentos recentes dos mercados refletem uma dança complexa entre juros, inflação e política monetária. permeando tanto o fascínio crescente por tecnologia, quanto, dicotomicamente, a ânsia por ativos de segurança:
Juros globais e política monetária
Em 2024–2025, os bancos centrais do mundo todo repetem uma dança: resistência contra inflação, mas pressão para cortes futuros. A cada sussurro de que o Federal Reserve (Fed) poderá recuar com a taxa de juros, ativos de risco reagem com alívio, enquanto o ouro capta fluxo de fuga.
Em particular, a credibilidade do Fed e o grau de “expectativa de cortes” (forward guidance) tornam-se variáveis decisivas. Se o mercado desacreditar na política monetária (e nas taxas futuras diminuírem menos do que o precificado), a desconfiança pode pesar sobre ativos mais alavancados tecnologicamente.
Inflação, desvalorização cambial e expansão monetária
Parte das preocupações dos investidores gira em torno da inflação persistente, especialmente num ambiente de estímulos fiscais, déficits elevados e políticas monetárias frouxas em outros países.
Em paralelo, moedas nacionais vulneráveis (em economias emergentes) pressionam os agentes a buscar proteção em ativos como ouro, dólar e moedas fortes. Nesse contexto, naturalmente, ativos globais de tecnologia são oportunidade de aposta em moeda forte e escala.
Risco geopolítico e reorientação de cadeias globais
Tensões EUA-China, disputas sobre semicondutores, sanções e restrições operacionais criam incertezas sistêmicas. Em momentos assim, o apetite pelo seguro financeiro cresce, mesmo que o custo de oportunidade pareça elevado.
Esse cenário cria um terreno fértil para o dilema: aumentar exposição aos ativos de tecnologia ou buscar proteção de carteira na tangibilidade do ouro?
Por que o ouro está subindo?
A ascensão meteórica do ouro em 2025 não é um fenômeno isolado, mas sim um espelho das condições globais que incitam a aversão ao risco. Estamos, com isso, vendo o metal alcançar patamares que até pouco tempo pareciam inacreditáveis.
No momento em que escrevo este artigo, a cotação da onça troy do metal ultrapassou US$ 4.254, em uma sucessão de recordes históricos, acumulando alta de mais de 50% este ano.
É consenso no mercado, que quatro pilares explicam essa alta histórica:
- Expectativas de cortes de juros pelo Federal Reserve em 25 pontos-base nas taxas de juros em outubro e dezembro;
- Tensões geopolíticas e instabilidades macroeconômicas globais;
- Estresse crescente nos mercados de crédito, volatilidade acentuada nas taxas de juros e uma insegurança generalizada nos mercados de ações;
- Bancos centrais diversificando suas reservas, visando reduzir a dependência do dólar americano e fortalecer a resiliência monetária de suas nações.
Em momentos como este, o metal funciona como espelho das emoções do mercado: quanto maior o medo, mais brilhante ele fica.
A euforia da inteligência artificial
Em contraste com a cautela que impulsiona o ouro, o setor de inteligência artificial e tecnologia vive uma era de euforia e expansão sem precedentes. O mercado vê na IA a próxima revolução industrial capaz de transformar setores inteiros e multiplicar lucros.
Gigantes e startups atraem investimentos bilionários: a Anthropic, por exemplo, foi avaliada em US$ 183 bilhões, após captar US$ 13 bilhões em uma única rodada. O investimento em infraestrutura de data centers cresce mais de 30% ao ano, segundo o Bank of America, impulsionado pela corrida pelo poder computacional.
A narrativa é sedutora: produtividade sem limites, lucros exponenciais, transformação total.
Mas toda euforia carrega riscos, e é aí que as vozes mais experientes pedem cautela.
O alerta de Howard Marks
Howard Marks, fundador da Oaktree Capital e um dos maiores observadores de ciclos de mercado, revisita seu conceito de “bubble thinking”: o perigo não está apenas em preços altos, mas na psicologia coletiva que os sustenta. Ele lembra que “caro” não significa “vai cair amanhã”, mas alerta para a necessidade de reduzir posições agressivas e fortalecer defesas.
Em seu memo The Calculus of Value, uma obra ainda não disponível em português, reafirma que o preço de um ativo, sem relação com seu valor intrínseco, é perigoso, e que “preço acima de valor tende a caminhar para baixo no longo prazo“, ainda que desvios no curto prazo sejam consideráveis.
Em outras palavras, quando o preço se afasta demais do valor real, a “gravidade do mercado” acaba puxando de volta, às vezes devagar, às vezes de forma dolorosa.
O mercado monitorando riscos
A visão de Marks encontra eco nas principais instituições globais. O Bank of England alertou recentemente que as avaliações em empresas focadas em IA estão “esticadas” e que o risco de uma correção súbita aumentou. Essa preocupação faz sentido: hoje, as ações de tecnologia representam cerca de 40% do S&P 500, o que torna o mercado altamente concentrado.
Uma recente pesquisa do Bank of America mostrou que 54% dos gestores institucionais acreditam que os papéis de IA estão em bolha e 60% veem as ações globais como supervalorizadas. Além disso, um artigo de pesquisadores da Cornell University apontou que o uso crescente da IA nos mercados financeiros pode amplificar efeitos de manada, realimentar bolhas e gerar instabilidades..
Por outro lado, líderes como Jamie Dimon, do JPMorgan, lembram que “não é toda IA que é bolha” , mas que, inevitavelmente, muitos projetos individuais vão fracassar. Ou seja: o boom pode ser assimétrico, com grandes vencedores e uma multidão de perdedores.
O que os números contam
O ponto de atenção está no fato de grandes empresas de tecnologia estarem sendo negociadas com múltiplos de preço sobre lucro ajustado por crescimento (o famoso PEG) em níveis historicamente elevados.
Em termos simples, isso significa que o mercado está pagando muito caro hoje por lucros que talvez só existam daqui a alguns anos, ou que talvez nem se concretizem.
Além disso, várias dessas empresas de Inteligência Artificial ainda não geram dinheiro suficiente para se sustentar, dependendo constantemente de novos aportes de investidores.
Quando o mercado inteiro se empolga e segue essa euforia sem olhar os riscos, cria-se um ambiente perigoso, no qual basta uma decepção para provocar grandes correções de preço.
Como o investidor deve se posicionar
O mercado é feito de probabilidades e não de certezas. Por isso, minha recomendação para você não é nova: não tente adivinhar o que acontecerá, posicione-se sempre de forma equilibrada, privilegiando o balanceamento e diversificação de sua carteira.
Em um cenário otimista, a IA entrega crescimento real e o investidor exposto colhe frutos excepcionais. Se vier uma correção, o ouro amortece as perdas. E, num mundo mais provável, de crescimento modesto, inflação teimosa e juros altos, quem tiver equilíbrio e liquidez estará na frente.
Pense no ouro como o seu hedge estratégico contra a incerteza dos Bancos Centrais e a volatilidade geopolítica. E pense na IA como a sua aposta no futuro, mas com um pé no freio do valuation. O verdadeiro “dinheiro inteligente” não está apenas surfando a onda, mas se posicionando para quando a onda quebrar.
Entre o medo e a ambição
No fim das contas, o dilema entre o ouro e a IA é mais do que financeiro, é psicológico. É o embate entre o instinto de proteção e o impulso de conquista que existe em todo investidor.
O segredo não está em escolher um lado, mas em entender o ciclo e respeitar o tempo, pois em qualquer era, seja de algoritmos ou de minas douradas, quem domina o equilíbrio entre medo e ambição é quem permanece no jogo.
Eduardo Mira é investidor profissional, analista CNPI-T (Apimec), mestrando em Economia, com MBAs em Gestão de Investimentos, Análise de Investimentos e Educação Financeira, empresário, sócio do Clube FII e do Grana Capital, escritor e educador financeiro com cursos que já formaram mais de 50 mil alunos. Está nas redes sociais como @professormira
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