Como Trump Ganhou Quase US$ 1 Bi com Criptos em Meses

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Donald Trump está lucrando com criptomoedas. Nos últimos nove meses, começando um pouco antes das eleições, ele entrou em novos empreendimentos, lançou novas moedas e gerou ainda mais barulho. Tudo isso está rendendo dinheiro ao presidente, mas quanto exatamente? Cerca de US$ 1 bilhão (R$ 5,59 bilhões), segundo cálculos da Forbes, o que elevou seu patrimônio líquido para um valor estimado de US$ 5,6 bilhões (R$ 31,3 bilhões).

As criptomoedas fizeram mais do que apenas deixar Trump mais rico — também forneceram uma liquidez que ele precisava com urgência. Um ano atrás, ele estava com pouco dinheiro em caixa, com cerca de US$ 400 milhões (R$ 2,23 bilhões) em seu balanço e mais de US$ 500 milhões (R$ 2,79 bilhões) em condenações judiciais contra ele, a maior parte decorrente de um caso de fraude que ele perdeu — e que atualmente está recorrendo. Agora, no entanto, Trump possui cerca de US$ 900 milhões (R$ 5,03 bilhões) em ativos líquidos, sendo que cerca da metade desse valor vem de empreendimentos ligados a criptomoedas.

Há ainda centenas de milhões — talvez bilhões — a caminho. A World Liberty Financial, uma das empresas ligadas a Trump, está apenas começando a crescer. Enquanto isso, sua memecoin — uma criptomoeda lançada pouco antes da posse — começou a liberar tokens desbloqueados para Trump e seus parceiros. Até agora, eles receberam cerca de 8% da cota. Com os outros 92% ainda por vir, não é surpresa que o presidente esteja fazendo coisas como realizar jantares privados para quem estiver disposto a comprar sua criptomoeda.

“A equipe que está ajudando ele é, na verdade, bem esperta”, diz Jeff Dorman, diretor de investimentos da empresa de ativos digitais Arca. “Eles sabem que é preciso continuar adicionando funcionalidades para gerar valor.” Em outras palavras, o jantar que escandalizou Washington pode ter sido apenas a entrada.

Insiders do mercado cripto agora especulam sobre o que Trump pode oferecer aos seus investidores a seguir. “Os Trump abriram um novo clube em Washington, D.C. — talvez você ganhe acesso exclusivo a ele”, sugere Dylan Bane, analista da empresa de criptomoedas Messari. “Talvez você tenha algum tipo de acesso ao Mar-a-Lago. Ou a qualquer um dos hotéis, resorts ou campos de golfe dos Trump. Talvez consiga direitos especiais para investir em outros empreendimentos da família… As possibilidades são infinitas”, acredita Bane. Ainda mais quando se trata de um presidente que tem tão poucos escrúpulos em usar o poder para lucrar.

Da Truth Social para o bolso

A entrada de Trump no mundo das criptomoedas começou de forma absurda. “ANÚNCIO IMPORTANTE!”, ele publicou em dezembro de 2022 na Truth Social, outro de seus negócios que o ajuda a lucrar com a política. “Minha coleção oficial de Cartas Digitais Colecionáveis Donald Trump chegou!” Uma imagem no post mostrava Trump vestido como um super-herói, com uma capa vermelha, branca e azul nas costas e um cinturão dourado na cintura. “COMPRE SUAS CARTAS AGORA!”, ele escreveu. “Apenas US$ 99,00 (R$ 553,00) cada!” Até mesmo seus apoiadores mais fervorosos zombaram. “Pura insanidade”, disse Sebastian Gorka, ex-assessor adjunto da Casa Branca. “Não consigo mais com isso”, acrescentou Steve Bannon, ex-estrategista de Trump.

Já os fanáticos por ativos digitais adoraram. Eles compraram US$ 4,4 milhões (R$ 24,5 milhões) em cartas em um único dia, o que levou a novas rodadas de vendas. Trump, que tinha um acordo de licenciamento para promover a ideia, recebeu pelo menos US$ 7 milhões (R$ 39,1 milhões) em dinheiro e criptomoedas. Mas saiu com algo ainda mais valioso — a percepção de que as criptomoedas, um setor que ele antes ridicularizava como “altamente volátil e baseado no nada”, podiam lhe render caminhões de dinheiro.

Salto pós-eleição

Às vésperas da eleição de 2024, Trump lançou outro empreendimento: a World Liberty Financial, promovendo o projeto de finanças descentralizadas na Truth Social. “Prometi tornar a América grande novamente — desta vez com cripto”, declarou. “A #WorldLibertyFi pretende ajudar a tornar os EUA a capital mundial das criptomoedas!” Ou, ao menos, render uns trocados para Trump. O projeto começou vendendo tokens que não ofereciam participação nos lucros futuros.

Um gold paper explicava por que os tokens eram um bom negócio — ao menos para Trump. Após a venda de US$ 30 milhões (R$ 174 milhões) em tokens, a empresa de Trump ficaria com 75% de tudo que fosse arrecadado depois disso. Inicialmente, poucas pessoas compraram os tokens. Mas, depois que Trump venceu a eleição, um entusiasta de cripto chamado Justin Sun — que por acaso enfrentava acusações da Comissão de Valores Mobiliários dos EUA — investiu US$ 30 milhões (R$ 174 milhões), garantindo a Trump uma fatia de cada novo dólar investido nos ativos.

No dia 19 de janeiro, um dia antes do republicano retornar à Casa Branca, Sun anunciou mais um aporte de US$ 45 milhões (R$ 261 milhões). Outros investidores seguiram o movimento, comprando um total de US$ 550 milhões (R$ 3,19 bilhões) em tokens, o que resultou em uma fatia estimada de US$ 390 milhões (R$ 2,26 bilhões) para Trump. Segundo cálculos da Forbes, o presidente americano ficou com US$ 246 milhões (R$ 1,43 bilhão) após impostos.

Memecoins

Dias antes de assumir o cargo, Trump anunciou uma nova memecoin, o $TRUMP, com uma observação em letras miúdas alertando que ele “não se destina a ser uma oportunidade de investimento”. Mesmo assim, muitas pessoas investiram, permitindo que Trump e seus parceiros embolsassem US$ 350 milhões (R$ 2,03 bilhões) em taxas de negociação e criptomoedas atreladas ao dólar, segundo a empresa Chainalysis. A fatia exata de Trump nessa empreitada não é clara. Mas se ele ficou com 90% do valor recebido por ele e seus sócios — modelo parecido ao que ele usou na empresa-mãe do Truth Social —, Trump pode ter lucrado US$ 315 milhões (R$ 1,83 bilhão).

Esse valor representa cerca do dobro de tudo que o império imobiliário do presidente dos Estados Unidos gerou em lucros operacionais durante o ano mais lucrativo do seu primeiro mandato.

Refém dos EUA

A indústria cripto despejou mais de US$ 100 milhões (R$ 580 milhões) na eleição de 2024, reconhecendo que suas moedas “sem fronteiras” dependem fortemente das decisões do governo. Ao lançar sua própria memecoin, Trump deixou claro que não pretendia regulamentar o setor — pelo contrário, queria ser o centro da festa. A mania tomou conta da capital, com um baile cripto no Andrew W. Mellon Auditorium antes da posse, frequentado por nomes como o CEO da Coinbase, Brian Armstrong, e ícones culturais como Snoop Dogg. “É hora de celebrar tudo que representamos”, postou o presidente eleito. “VENCENDO!”

O ganho estimado de US$ 315 milhões (R$ 1,83 bilhão) com a memecoin, no entanto, foi só o começo. Trump e seus sócios lançaram inicialmente 200 milhões de tokens, mas estruturaram o projeto para receberem, ao longo do tempo, mais 800 milhões. Esses tokens adicionais ficaram bloqueados no início, mas começaram a ser liberados em abril, aumentando o patrimônio líquido do presidente. Até agora, Trump e seus parceiros liberaram 64 milhões de tokens, ou 8% do total a que terão direito.

Atualmente, a memecoin do bilionário está cotada a US$ 11 (R$ 63,80), o que indica que os tokens recém-desbloqueados podem valer cerca de US$ 700 milhões (R$ 4,06 bilhões). Mas especialistas do setor questionam se Trump (ou qualquer outro) conseguiria vender 64 milhões de tokens por esse valor, já que pode não haver compradores suficientes.

Uma forma de medir o mercado é considerar o valor total dos 200 milhões de tokens lançados inicialmente, que hoje valem US$ 2,2 bilhões (R$ 12,76 bilhões). Para compensar possíveis perdas por excesso de oferta, a Forbes dividiu esses US$ 2,2 bilhões (R$ 12,76 bilhões) pelos 264 milhões de tokens atualmente disponíveis para negociação, o que gera um valor estimado de US$ 525 milhões (R$ 3,05 bilhões) para os desbloqueados. Ao aplicar o desconto padrão de 10% da Forbes para ativos com liquidez duvidosa, esse valor cairia para US$ 475 milhões (R$ 2,75 bilhões). Se Trump possuir 90%, sua participação pessoal seria de cerca de US$ 427 milhões (R$ 2,47 bilhões). Mais de US$ 3 milhões (R$ 17,4 milhões) em tokens adicionais são liberados diariamente.

Presidência à venda

Em meio a toda essa complexidade financeira, é fácil perder de vista o que Donald Trump realmente está vendendo: a presidência. Afinal, antes de vencer a eleição de 2024, sua memecoin não existia e a World Liberty Financial não parecia tão promissora.

Mas, há cerca de um mês, Eric Trump, que comanda a Trump Organization enquanto seu pai está no cargo, subiu ao palco de uma conferência em Dubai. Ao seu lado, sentado, estava Zach Witkoff, filho de Steve Witkoff, que testemunhou em defesa do presidente em seu julgamento por fraude e agora integra seu governo. Quem entrevistou os dois foi Justin Sun, o magnata que despejou dinheiro na World Liberty logo após a eleição.

Diante de uma plateia de entusiastas de cripto, o momento marcou algo como o debut oficial da World Liberty Financial. A empresa havia acabado de lançar uma stablecoin chamada USD1. Como outras stablecoins, a USD1 é atrelada ao dólar e permite que investidores entrem e saiam do universo cripto sem se preocupar tanto com a volatilidade. Ainda não está claro o que diferencia a USD 1 das demais — além do fato de estar ligada ao presidente. “Qualquer um pode emitir uma stablecoin”, explica Matt Zhang, fundador da empresa de ativos digitais Hivemind. “O difícil é conseguir que as pessoas realmente usem.”

Para Trump, um homem que sempre teve talento para atrair multidões, as stablecoins são dinheiro fácil. Investidores entregam dólares e, então, emissores como a World Liberty criam uma versão digital baseada em blockchain e geralmente investem os recursos em títulos do Tesouro como reserva. No entanto, ao contrário dos bancos que oferecem juros sobre depósitos, os emissores de stablecoins frequentemente ficam com toda a renda que obtêm desses investimentos. Assim, quanto mais pessoas Trump convencer a usar sua nova stablecoin, mais dinheiro sua empresa, a World Liberty, vai ganhar.

“Passamos por uma jornada incrível”, disse sorrindo Justin Sun, que passou a infância na China e aprendeu inglês assistindo a “O Aprendiz”. “Qual é o próximo passo?” Witkoff respondeu em um anúncio: uma empresa criada pelo presidente dos Emirados Árabes Unidos planejava usar a moeda da família Trump para fazer um investimento de US$ 2 bilhões (R$ 11,6 bilhões) na Binance, uma das maiores corretoras de criptomoedas (que também enfrentava acusações da SEC, retiradas na semana passada). A capitalização total de mercado da stablecoin de Trump agora chega a US$ 2,2 bilhões (R$ 12,7 bilhões). Se a World Liberty conseguir obter 4% ao ano em juros, isso vai render cerca de US$ 90 milhões (R$ 517,5 milhões).

Não é preciso ser um teórico da conspiração para imaginar que há algum tipo de acordo suspeito por trás disso. “Você não precisa usar uma stablecoin específica — um dólar é um dólar”, diz Bane. “Então, se você usa uma, provavelmente existe um motivo oculto.”

Se a World Liberty for avaliada de forma semelhante a outros emissores de stablecoin, ela pode valer cerca de US$ 125 milhões (R$ 718,7 milhões) hoje. Supondo que a família Trump, que aparentemente detém 60% de participação, divida essa fatia da mesma forma que dividiu seu antigo hotel em Washington, a parte de Trump pode valer até US$ 60 milhões (R$ 345 milhões).

Marketing arriscado, mas certeiro

A World Liberty Financial, a Trump Organization e a Casa Branca não responderam a uma lista de perguntas sobre os empreendimentos do presidente no setor de criptomoedas. No mês passado, no entanto, a secretária de imprensa Karoline Leavitt repreendeu um jornalista que sugeriu haver algo tóxico na mistura de negócios e política de Trump. “É um absurdo alguém insinuar que o presidente está lucrando com o seu cargo”, declarou Leavitt. “Ele teve um sucesso incrível antes de abrir mão de tudo para servir ao nosso país.”

Na verdade, o presidente não abriu mão de tudo. Ele fez exatamente o oposto. Manteve a posse de seu antigo império empresarial enquanto criava novos empreendimentos para lucrar com seu segundo mandato.

Manter a festa acontecendo exigirá talento para vendas. Isso é uma boa notícia para a família Trump, que dominou a arte da autopromoção há gerações, quando Fred Trump, pai de Donald, aprendeu a usar os jornais para criar entusiasmo em torno de projetos imobiliários. O universo das criptomoedas está repleto de promotores com truques para valorizar tokens, como distribuir criptomoedas de surpresa.

Como Trump e seus parceiros devem controlar 800 milhões das 1 bilhão de memecoins $TRUMP que serão emitidas, eles certamente podem se dar ao luxo de distribuir uma parte dos tokens para gerar interesse. Na quarta-feira (4), a World Liberty Financial afirmou ter distribuído US$ 4 milhões (R$ 23 milhões) em USD1. Mas Trump, o maior vendedor da história dos Estados Unidos, também pode oferecer prêmios únicos, como um jantar de gala para os maiores detentores de seus memecoins. “Acho que nunca houve um jantar formal e grandioso de membros de uma comunidade só por possuírem tokens”, diz Bane. “Isso é inédito.”

Se desconsiderar os conflitos de interesse, há certa genialidade empresarial em tudo isso. Segundo Dorman, as pessoas compram coisas por três motivos: (1) lucro futuro, como um negócio que gera caixa; (2) utilidade, como um pedaço de aço; e (3) estilo ou status, como uma figurinha de beisebol. No início, a moeda de Trump parecia depender apenas do fator “legal”. Mas, ao oferecer um jantar, Trump adicionou um pouco de utilidade à sua moeda. Quanto mais brindes ele oferecer, mais sua moeda começa a parecer um investimento de verdade. “Se você começa a adicionar funções de utilidade e financeiras, então já não dá mais para chamar isso de memecoin,” diz Dorman. “Essa é a primeira memecoin de peso que tenta fazer esse tipo de coisa”, explica.

Quem conhece o funcionamento das campanhas políticas sabe que algumas pessoas estão dispostas a pagar centenas de milhares, talvez até US$ 1 milhão (R$ 5,8 milhões), para jantar com um político. No universo cripto, onde os absurdos se acumulam, investidores aparentemente estão dispostos a desembolsar vários milhões por essas regalias. Um esquema tão evidente de enriquecimento próprio atrai bastante cobertura negativa. Mas Trump há muito tempo se beneficia — tanto na política quanto nos negócios — de sua disposição para fazer coisas que envergonhariam muitas pessoas.

A comunidade cripto, ou pelo menos uma parte considerável dela, parece não se importar nem um pouco com as questões morais envolvidas nisso tudo. Na verdade, o fato de Trump encarar a ética como pouco mais que um incômodo talvez até valorize seus empreendimentos em cripto. Se as pessoas acreditam que Trump age sem limites, podem imaginar todo tipo de benefício que poderiam receber ao comprar a moeda digital do presidente.

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